domingo, 26 de fevereiro de 2012

Quatro dias no fundo do oceano: uma breve ode ao carnaval que nunca foi


Para cada tamborim carioca, um suspiro.

Mal começara a última quarta-feira de cinzas e já ouço um dileto e preclaro sujeito maldizer o carnaval. Tudo bem, sem pânico: era nada além daquele adorável senso-comum de quem ataca o gasto de verbas públicas (ou qualquer coisa assim). A conversa foi até o ponto em que gajo diante de mim acabou por condenar o ‘governo’ a abandonar o carnaval e sei lá mais o quê. Aparentemente há demasiadas escolas e hospitais públicos esperando uma reforma, querendo dizer que não dá para ficar aí gastando tempo e dinheiro com pombagirisses.

Fitei-o abismado e contido por meio segundo, tomei um gole do meu copo de água e soltei um apático “pois é”. Silenciosamente discordei, porque essa discussão é algo cansativo demais até para quem a começa, e de qualquer forma agora não é hora para começar presunçosas reflexões acerca do erário ou do dinheiro dos outros.

O assunto do momento é o silêncio, Explosions in the Sky e a fina arte de sentir-se alheio. Porque isso é o que se passa no carnaval aqui em terras com aspirações germânicas, fora os desfiles de carros alegóricos televisionados. Fora também os comentários ranzinzas, o desdém pelas multidões e todo o contingente de carros fugindo para o litoral. Veja, nem é uma confissão mal-humorada; há alguma coisa em cidades vazias que me alegra profundamente. “São nesses momentos que crescemos”, como diz um grande amigo meu.

De fato, tem aquela história toda da contemplação, com momentos de introspecção meio Caio Fernando de Abreu sobre a ponte de ferro que cruza o Itajaí-Açu à noite e as lâmpadas dos postes refletidas na água. É verdade; coisas pequenas parecem deveras profundas depois das duas da manhã, o que no fim acaba justificando a bandeira de Santa Catarina, uns poemas aí e minha decisão de não ter ido a lugar nenhum.

Mas também não é bem assim. Nunca é bem assim: a decisão parece passar por uma crise de identidade assim que saio da ponte, e pousa o ponto de interrogação sobre a tremenda omissão que foi esse feriado. Podia ter ido passar os quatro dias vendo sorrisos diferentes em ruas de nomes novos que serão logo esquecidos (quem afinal é ‘Professor Caio Mário’?), mas ficamos aí a ouvir música instrumental.

E é então que me contradigo: saudosas ruas sem carros não são o bloco do Sargento Pimenta junto de milhares de pessoas, e talvez da mesma forma não são festas à fantasia aquelas em que não há fantasiados. Isso não é baile de máscaras (e suspeito que não seja coisa alguma). Meu idealismo parvo estava pulsante: senti falta de viver num lugar que exalasse um entusiasmo de muitas décadas de idade e com pilhas de histórias mais do que memoráveis. Talvez seria ainda agradável poder rir junto com quem diz que o Brasil só começa depois do carnaval, porque parece que o ano já está aí desde os primeiros dias de janeiro e acabo nem entendendo o que isso quer dizer. Pois é, talvez devesse ter ido ao Rio de Janeiro também para ver se não me convencia de que lá não é Pasárgada.

Isso, ou quem sabe a conclusão é bem simples mesmo. Não vi nada de karneval porque estamos em dias de inspiração diminuta, de referência nenhuma e de vontades gigantescas. Não tem samba enredo que resista ao ócio não-criativo. E pensando bem, podia ter sido até o carnaval em outro lugar, em Floripa ou sei lá. Ou em Navegantes, talvez em Colônia ou até na Penha; o erro foi ter ficado por aqui arranhando o cello desafinado pro vizinho que sobrou.

Depois de uma semana, agora enfim depois de um porre atrasado mas praticamente carnavalesco, só resta dizer: Blumenau não tem culpa. Estejamos mal da cabeça ou doentes do pé, carnaval é coisa nossa.

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Histórias de outros carnavais:

* Explosões:

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